O tempo, inabalável na mansa malha dos dias e das noites, nunca ofega. Inspira e expira o ventre onde tudo se cria. A mais sutil mudança na pedra, o deslocamento da menor partícula de ar divisível, o mínimo escorrer das águas, a insignificante transformação humana se dão nas tramas airadas do tempo. O tempo flutua invisível e em espesso presente. Nada apodrece sem ele. Nada floresce. Nada se torna amável. Nenhum ódio viceja. Nenhuma umidade seca. Nenhuma sede cede. As tempestades não inquietam nele ventos, as avalanches não podem soterrá-lo, a perplexidade não o paralisa, o mal não o ameaça e o bem não faz com que se demore. Mais eis que um acontecimento, um único acontecimento, captura o tempo e o aprisiona.